Diz que Deus diz que dá: como a História, a Filosofia e a Ciência organizam as sugestões da Natureza


Diz que Deus diz que dá: como a História, a Filosofia e a Ciência organizam as sugestões da Natureza

Ana M. Segadães é engenheira química pela Universidade de Coimbra, Portugal, recebeu o grau de PhD pela Universidade de Sheffield, Reino Unido (pelo qual recebeu o Berthold Eichler Memorial Prize) e fez a Agregação (o mais alto grau acadêmico das universidades portuguesas) na Universidade de Aveiro onde vem desenvolvendo sua carreira docente. Sua especialização em Diagramas de Equilíbrio de Fases motivaram o convite para um primeiro pos-doc na Universidade Federal de São Carlos-SP, Brasil, do qual ramificaram colaborações com várias outras instituições brasileiras. Já o trabalho de pesquisa que desenvolveu na Universidade da California em Santa Barbara, USA, derivou para a reologia e o processamento coloidal de materiais cerâmicos. Seus atuais interesses de pesquisa também incluem a síntese de pós de óxidos, o empacotamento de partículas e a reutilização de resíduos industriais.  É coautora de 110 artigos científicos publicados em periódicos do SCI, que receberam 2747 citações e geraram um H-index de 29. Foi recentemente homenageada com a inclusão no livro “Mulheres na Ciência” (https://www.cienciaviva.pt/mulheresnaciencia/home/?id=5144&ano=2023).

Ana Maria Segadães
Universidade de Aveiro

 

Resumo

Usando a história do desenvolvimento da porcelana, pode acompanhar-se a caminhada da Humanidade em direção ao Conhecimento, em acasos felizes, cópias descaradas e entendimento genuíno.  E para demonstrar que, como em qualquer caminhada, o caminho é mais importante do que o destino, a Natureza vai mostrando que há sempre uma nova colina depois de cada uma cujo topo se atinge, i.e., a (re)descoberta da ignorância. No caso dos cerâmicos, as pressões ambientais e o custo crescente de matérias-primas naturais e transportes podem ser vistos como uma tal nova colina. Perante a generosidade natural dos produtos à base de argilas, que permite a incorporação fácil de uma grande variedade de materiais (nomeadamente resíduos, até os potencialmente perigosos) sem degradação significativa das propriedades tecnológicas, a indústria cerâmica tradicional poderá tornar-se no usuário final dos resíduos de outras indústrias, e lucrar com isso. Os diagramas de fases explicaram o fabrico da porcelana e podem agora ser usados para fazer escolhas inteligentes de composições e parâmetros de processamento, poupando tempo e recursos. Mais, o entendimento traz consigo a liberdade e permite a inovação. Em vez de se substituir cegamente um ingrediente da mistura original, o uso de ferramentas complementares (matemática, química, termodinâmica) pode guiar a escolha de uma matéria-prima alternativa, privilegiando o papel que irá desempenhar na conformação (processamento), na consolidação (queima, cura) ou nas propriedades finais, ao serviço da criatividade e apoiando a progressão na subida desde o Poço do Desespero em direção ao topo da colina do Conhecimento.